Comprando figurinhas da Copa 2010 com minha filha (Alice) dei de cara com dois números da Coleção Folha Raízes da MPB: Dorival Caymmi e Lupicínio Rodrigues. Brinquei com o jornaleiro: “isso é apelação meu caro esses compositores são geniais!” tanto foi que levei os dois números. Comecei a audição pelo número do Dorival e fiquei surpreso com a qualidade das gravações. Brinco que quando ouço “O que é que a baiana têm” tenho a impressâo de que Carmem Miranda está de carona no meu carro. Momentos impagáveis identificados pelo meu filho Nino podem ser apreciados na interpretação descontraída e competente de Elza Soares na faixa “O Samba da Minha Terra”. Magníficas também são as interpretações de Caymmi para as belíssimas: “O Mar”, “Das Rosas” e “Saudades da Bahia” querevelam o talento do cantor ao interpretar peças de profunda dramaticidade nos coroando com um olhar naife das belezas da Bahia, tão bem desenhada em seus versos e canções. Tudo isso sem falar nas magistrais interpretações de Clementina de Jesus, Dick Farney, Ângela Maria, Gal Costa e dos talentosos filhos Nana e Dori. A Coleção conta ainda com design gráfico de qualidade no qual encontramos as biografias atualizadas dos compositores. E por falar em biografias me recordo que no dia da morte de Dorival Caymmi voei para o Rio de Brasília e por coincidência passei pelo cemitério em Botafogo no fim da tarde de seu sepultamento. Me recordo que escrevi um email para um amigo durante o vôo falando da tristeza que senti e das circunstãncias impressionantes que envolveram sua partida. Vejam abaixo:
Vôo de Brasília para o Rio de Janeiro 17/08/2008 às17h02
“Arthur,
Estou indo para o Rio de Janeiro. Ontem foi o aniversário da Madonna, o Dorival Caymmi morreu e houve um eclipse lunar. A morte de Dorival Caymmi me entristeceu muito, principalmente por saber que seu estado piorou quando sua mulher Stella entrou em coma. Que história! Ela estava no hospital havia quatro meses e ainda assim ligava para ele todo dia. Na última semana Dona Stella entrou em coma e parou de ligar para o marido. Dorival sentiu a falta da mulher que o acompanhava há sessenta e tantos anos e simplesmente morreu. Pensa nisso cara! Tudo bem ele estava doente, mas a ausência do seu amor foi demais, foi a gota d´água que faltava.
Estou muito triste pela família Caymmi. Pensa você ter o pai morto e a mãe em coma. Que dó. Que desamparo eles devem estar sentindo.
Que perda para nós brasileiros.
Nos últimos anos estudando música, estudei a obra de Dorival. Tenho todos os seus songbooks e descobri uma canção dele que não foi gravada por ninguém. Cantei essa música na minha apresentação anual. Chama-se Ninguém Sabe e é assim:
Ninguém sabe / Que eu não tenho mais amor.
Ninguém sabe / Como é grande a minha dor.
Nesse mundo, quem ama sempre perde
E é por isso que é melhor
Viver sem amor,
Ninguém sabe / Que eu não tenho mais amor,
Ninguém sabe / Como é grande a minha dor.
Essa música é uma parceria de Dorival com Carlos Guinle. Carlinhos, como era chamado, foi um grande amigo de Dorival quando passou a morar no Rio de Janeiro vindo da Bahia. Filho do milionário dono do Copacabana Palace, Carlinhos Guinle morreu precocemente aos trinta e poucos anos de idade e da parceria com Dorival deixou, no máximo, umas sete canções entre elas temos: Não tem Solução, Sábado em Copacabana e Valerá a Pena. São canções belíssimas feitas num Rio de Janeiro charmoso da década de cinqüenta. Carlinhos Guinle era um playboy muito rico e pelas fotos e reportagens ao lado de Caymmi, que era o charme em pessoa, viviam em festas, rodeados de muito luxo e sofisticação. Considero esta a fase mais interessante da obra de Dorival Caymmi.
Depois, com tempo e sem dor e tristeza, canto para você todas as canções que citei.
Abraço,
Adauto”
Dorival Caymmi no veleiro Laffite, do amigo Carlos Guinle, década de 50. Foto: Arquivo Agência A Tarde
Adauto querido,
Que lindo ver a sua maneira de expressar e compartilhar seu conhecimento e paixão pelas artes! Parabéns!! Com certeza passarei por aqui sempre, abraço enorme,
Kruskaya
Querida Kruskaya,
Muito agradecido pela atenção e pelo incentivo.
Beijo,
Adauto